“Para entender o que aconteceu com a Iesa é preciso primeiro, saber o que é uma indústria de bens de capital. Indústria de bens de capital é uma empresa que faz equipamentos para a infraestrutura. Pontes rolantes, equipamentos para refinarias e plataformas de petróleo, locomotivas, turbinas e geradores para usinas elétricas, estes são os produtos da Iesa. Uma empresa como esta só dá certo em um País que cresce mais de 5% ao ano (referência ao Produto Interno Bruto). No Brasil, não dá certo”, explica João Leal, ex vice-presidente da Iesa, que trabalhou 33 anos lá. Ele se desligou em 2014, ano que começou a ‘crise’ e quando mais de mil pessoas foram demitidas.
“Me emociono ao falar da Iesa. Trabalhei lá desde a época da Villares. Para quem é engenheiro, como eu, ver aquela fábrica parada é uma tristeza muito grande”, diz Leal. Atualmente, o clima tenso e o medo do futuro marcam a rotina dos poucos mais de mil funcionários que restaram na Iesa Projetos, Equipamentos e Montagem. Não se sabe o que virá no dia seguinte e a qualquer momento pode chegar a notícia de falência.
Se alguém, há cinco anos, durante os tempos áureos da metalúrgica previsse o cenário atual, com certeza seria chamado de maluco. A Iesa, do gigante grupo Inepar, com faturamento estratosférico, batia o seu recorde de operação entre os anos de 2010 e 2012, após um crescimento vertiginoso. Mais de 3 mil funcionários batiam o ponto na fábrica, que foi considerada um dos maiores parques metalúrgicos da América Latina.
Hoje, a realidade é bem diferente. Após três meses de greve, os funcionários voltaram essa semana ao trabalho após o pagamento do salário de setembro – com teto máximo de R$ 3 mil – e da garantia de que até janeiro os próximos salários serão cumpridos.
“O que recebi deu apenas para pagar algumas das contas acumuladas todo esse tempo”, lamenta o operador de máquinas Antônio Carlos da Conceição, de 38 anos. “Você não vê um funcionário trabalhando feliz. Está todo mundo preocupado.”
Sem mercado para atuar
Durante sua história, a Iesa se beneficiou de períodos de crescimento econômico sendo fornecedora para obras e empresas públicas.
Uma dessas empresas era a Petrobrás, que também vive em crise, bem como as principais empreiteiras do País, envolvidas em escândalos de corrupção. Dois dos diretores do grupo Inepar, inclusive, foram detidos na Operação Lava Jato.
Mesmo com tudo isso, entretanto, o desempenho da Iesa poderia ter sido melhor se tanto o Governo como a iniciativa privada não tivesse deixado de investir tanto nesses últimos anos. “Não é que o mercado está fraco. Ele desapareceu”, cita Waldemar Sattin Júnior, diretor comercial da Iesa.
Do auge à crise
Vários são os fatores que culminaram na grande crise que a empresa vive hoje. Além de erros administrativos, também houve investimentos milionários que não deram o retorno esperado, como o projeto de telefone via satélite Iridium, em 1998, que faliu.
Mas, mais que isso, uma metalúrgica de equipamentos pesados, como é a Iesa, precisa do bom andamento da economia nacional e internacional, pois depende de investimentos em grandes obras para prestar seus serviços. Boa parte desses investimentos, aliás, com participação direta do poder público, como a construção de hidrelétricas e termelétricas.
O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) anunciado no primeiro ano do Governo Luís Inácio Lula da Silva (PT) teria sido uma grande alavanca na empresa, porém, inúmeros fatores políticos e econômicos levaram o País a frear investimentos e com isso, a empresa também perdeu.
‘Nunca houve crise como essa, mas vamos nos recuperar”, acredita Atilano
O fundo do poço já chegou, acredita a diretoria da empresa. Em setembro de 2014, a Iesa entrou com pedido de recuperação judicial, que foi aprovado e ainda está em vigência.
Até agora R$ 1,2 bilhão em dívidas com credores foi transformada em ações da empresa. Ainda restam R$ 800 milhões para serem negociados. O total do endividamento da Iesa é de R$ 2 bilhões. Segundo Atilano de Oms Sobrinho, presidente do Conselho de Administração da Inepar, é esperada para os próximos meses a liberação de mais de R$ 300 milhões, bloqueados pela Justiça.
O presidente garante que esses recursos seriam suficientes para acertar boa parte das dívidas trabalhistas e fazer com que a Iesa consiga ‘sobreviver’ ao processo de recuperação judicial.
“Não acredito que a Iesa corra risco de fechar. Nunca houve uma crise como essa, mas nossa empresa tem um histórico de cinco décadas e nossos credores acreditam em nossa recuperação”, afirma Atilano.
Mais pessoas serão demitidas
Nesse momento, boa parte da Iesa de Araraquara está ociosa. Não há serviços para movimentar toda a capacidade produtiva da metalúrgica.
Com a falta de recursos por conta da recuperação judicial, os funcionários só retornaram ‘ao batente’ essa semana porque outra empresa, a Andritz Hydro, aceitou adiantar um pagamento à Iesa, ajudando, assim, a honrar os salários de setembro. A diretoria da Iesa garante que os trabalhadores vão receber todo mês até janeiro.
A esperança da diretoria é que, nesse período, haja a liberação dos recursos milionários presos na recuperação judicial e não nega: deve haver novas demissões.
Demissões
A intenção da diretoria é reduzir mais ainda a mão-de-obra da metalúrgica e, assim, manter o mínimo possível de trabalhadores para que a empresa siga operando e possa, com uma esperada melhora da economia, voltar a crescer e contratar.
Mas se a Iesa quiser demitir, de acordo com Paulo Sérgio Frigeri, presidente do sindicato da categoria, terá de pagar todos os encargos trabalhistas. “Não vamos aceitar. Se quiserem demitir, que se busque recursos para pagar tudo que deve aos funcionários no ato da demissão”, declara o sindicalista.
Futuro
Da mesma forma que vem ocorrendo com a Andritz Hydro, Atilano Sobrinho acredita que o pátio fabril de Araraquara possa servir de uma unidade de excelência em mecânica pesada e atrair outras empresas para utilizar seus equipamentos e sua capacidade, formando uma espécie de conglomerado de indústrias.
O diretor comercial Waldemar Sattin Júnior mostra uma previsão de investimentos de R$ 373 bilhões no País até 2020 nas principais áreas que a Iesa de Araraquara atua e que possam gerar demandas para a unidade.
“Esperamos que a recuperação de economia brasileira não demore sete anos, como foi nos anos 90, e a gente consiga voltar a crescer o mair breve possível”, afirma.
Conheça a história
A história da Iesa começou na década de 70, quando em São Bernardo do Campo foi inaugurada a Villares, que fabricava equipamentos para movimentação de cargas, pontes rolantes, locomotivas e guindastes. Na mesma década uma empresa metalúrgica que visava o seguimento de locomotivas era construída em Araraquara. Na década de 80, a Villares compra esta empresa e se torna uma gigante no setor.
Na década de 90, a Villares sai do mercado e deixa tudo na mão de funcionários, que resistiram seis anos no comando da empresa, chamada, então, de Sade Vigesa. Em 1996, a Inepar - fundada em 1968, no Paraná - compra a Sade.
Desde então, a história da empresa foi marcada por altos e baixos. Em 2003, em uma das maiores mudanças, todas as operações fabris são transferidas para a Iesa, nova empresa a integrar o grupo.
Em 2007, a carteira de pedidos da Iesa atinge R$ 2,4 bilhões, com vendas no ano de mais de R$ 1,6 bilhão. Em 2008, a empresa atinge o auge, cresce mais de 40% e mais de mil pessoas são contratadas.
Em 2012, 8 mil funcionários ocupam todas as unidades da Iesa do País, somente em Araraquara são mais de 3,5 mil. Em 2014, a empresa começa a sentir os efeitos da crise e de uma só vez demite cerca de mil pessoas. Hoje, a empresa amarga a falta de contratos e uma recuperação judicial.
Fonte: https://www.acidadeon.com/araraquara/cotidiano/cidades/NOT,3,7,1194431,Iesa+passa+por+crise+beira+falencia+e+deve+demitir+mais+ate+o+final+do+ano.aspx